Não que eu seja velho, mas fiz parte da geração que viveu a transição entre a bola de meia e a bola de futebol. E confesso: não trocaria aquela geração por nenhuma outra.

Não cheguei a jogar futebol onze contra onze com bola de meia, mas dei muitos chutes nela quando brincava em alguns pisos brutos por aí. Não era fácil dominar uma bola de meia, ainda mais em chãos cheios de inconsistências. Quem conseguia aparentemente teria um futuro promissor pela frente. 

Aos mais novos que não têm ideia do que estou falando, bola de meia era um brinquedo comum antigamente (pronto, estou parecendo velho). Amassávamos algumas folhas de jornais e enfiávamos dentro de meias de nylon gentilmente cedidas por nossas mães e rumávamos para as calçadas tentando ser um Zico da vida.

Aí passa o tempo, alguns se profissionalizam e o que mais se quer a partir de então é fazer bons contratos para garantir um futuro tranquilo para a família, embora muitas vezes, numa final, por exemplo, a parte financeira é deixada de lado, até por que o “bixo” já foi acertado. E, ao menos neste caso, um profissional realmente focado só direciona seu olhar para o caneco.

Aliás, conquistar título é deixar marca, é registrar o nome. E as marcas que deixamos são as únicas coisas que vamos levar no dia em que partirmos dessa para melhor. O resto fica tudo aqui. Inclusive dinheiro, bens, etc.

Mesmo quem atinge ou não uma carreira de sucesso, é quase impossível um profissional esquecer as calçadas cheias de buracos lá da infância ou aquela árvore de tronco inclinado que servia de trave. E como esquecer, também, a simplicidade de uma bola de meia, de uma número 5, talvez de uma Dente de Leite?

Muitas vezes o tipo de bola era o que menos importava. O negócio era estar lá, chutando-a, fosse em uma calçada, no bom e velho campinho, na quadra da escola. Coisas que não tinha preço.

Que bom se todo o profissional da bola valorizasse sua carreira e focasse na taça de campeão imaginando todas as dificuldades que ele teve para chegar aonde chegou. Todas as dificuldades mesmo, como uma árvore que servia de trave com seu tronco inclinado. Ali ele já “pegava a manha” e sabia como bater na bola, mesmo que fosse de meia. Sem dúvidas, era por ali que o sonho começava a florir.