Papai Noel Mágico
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sexta, 06 de dezembro de 2024

 

Jesus foi educado na lei mosaica, composta por longo e complexo emaranhado de mais de mil leis, que Ele, ao pregar o novo mandamento, resumiu em duas. A sociedade judaica tinha a presunção de julgar-se o único povo eleito e descriminava os demais chamando-os de pagãos. Se para a antropologia cultural atual, referir-se a alguém como pagão remete a indelicado preconceito, para a ética judaica significava diferenciação social necessária.

Ao dizer que comida, bebida e roupa constituem síndrome dos pagãos, Jesus parece armar arapuca para pegar os fariseus. Puxou esse assunto ao final do longo sermão da montanha quando proclamou a inutilidade da lei, se falta caridade no coração, e deu como sinal de vida nova o desapego às coisas. Nisto está o essencial da questão, pois os fariseus, cumpridores da lei, eram amantes dos primeiros lugares nos banquetes e de roupas ostentatórias. A lição que Jesus lhes imputou é: vocês são piores que os pagãos.

O sentido deste entrevero de Jesus com os fariseus ajuda a entender o espírito de nossa época e, principalmente, como a maioria prepara o Advento. Há comerciais que ridicularizam e debocham do sistema antigo de celebrar o Natal. No dia 17 de outubro, sintonizei, ao acaso, canal de TV no momento em que se fazia o lançamento apoteótico do “Papai Noel Mágico” com objetivo de “colocar mais alegria no coração de todos”, sendo que a verdade era vender 15% a mais, em relação ao Natal passado.

Segundo a lógica do mercado, o advento é o tempo de comprar e vender mais e para isso lança-se mão de elementos mercadológicos que são completamente estranhos ao fato histórico da festa - o nascimento de Jesus em Belém descrito pelo evangelista São Lucas e representado por São Francisco, o Presépio. Jesus diria do modo como se festeja o seu próprio nascimento: “isto não tem mais nada a ver com o meu aniversário. Essa história de papai noel mágico é coisa de pagão. Vocês deveriam preparar o Natal como Maria se preparou para o meu nascimento e como João Batista preparou o meu aparecimento na Galiléia”.

Naquela época, alguns sabiam que Maria daria à luz o Menino Jesus e outros, 30 anos depois, aguardavam seu aparecimento, em público, para iniciar sua evangelização. E hoje, quantos sabem que Natal é celebração do aniversário de Jesus e se dirigem ao presépio como os pastores e os reis magos? Apenas uns 50 %, segundo pesquisa que vi publicada há alguns anos. Esta ambigüidade e mistura de motivações pagãs e cristãs na celebração do Natal, predominando o estilo pagão, tem seu custo. Como o mercado e seus ícones publicitários roubaram a centralidade de Jesus, a festa, em si, perdeu a mística original e deixou imenso vazio espiritual na população. Não que haja algo de ilícito ocupar-se com a comida, bebida e a roupa. O equívoco está, segundo Jesus, em fazer dessas coisas a preocupação principal, deixando o presépio em segundo plano.

São Francisco idealizou e fez o presépio depois de ter reorganizado a sua vida a partir deste critério. História ou lenda, conta-se que ele, com amigos, preparou o presépio do jeito que é representado hoje, mas sem o menino Jesus. À meia noite dirigiu-se para lá desejando experimentar profundamente o verdadeiro espírito e sentido do Natal. Num momento de adoração e grande intimidade com Deus, viu o Menino Jesus tornar-se presente na manjedoura, de braços abertos como querendo abraçar a humanidade. O advento seria o tempo de preparar este momento de intimidade com o Príncipe da Paz que abre os braços para todos.

Nos primórdios do cristianismo, o advento era entendido como preparação do retorno de Jesus que viria para julgar a história dos homens. O Natal não era celebrado, aliás, era proibido, pois, comemorar o dia do nascimento de alguém era costume pagão.

A festa do Natal que se incorporou nas culturas de quase todo o mundo foi instituída oficialmente no ano de 354 pelo bispo romano Libério. Na verdade, a Igreja cristianizou costumes, lendas e mitos pagãos que existiam em diversas culturas. Em 1223, São Francisco originou o presépio, que talvez seja a mais divina cena humana que se possa imaginar, e que continua encantando as crianças e aqueles que acreditam que ali começou uma nova história para a humanidade.

Na modernidade presenciamos a repaganização do Natal. Jesus deixa de ser o personagem principal da festa. Retornam elementos estranhos ao que foi escrito pelo evangelista Lucas que relata o acontecimento, como fato histórico, em Belém. Ao lembrarmos de Belém avivamos a esperança de que a Paz que Jesus nos prometeu não é uma miragem, mas, realidade que está no meio de nós. Ele deseja que a coloquemos no íntimo do nosso coração. O Advento existe para isso.

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