Publicidade
Especial Olimpíadas
Olímpicos: à procura de mais uma jogada no ar
Inspirados por vitórias pessoais no esporte, Alexandro Machado Dutra e Marcelo Piton seguem fiéis ao esporte que amam e aguardam pelo retorno às quadras após a pandemia
Por: João Marcelino*
Publicado em: segunda, 14 de junho de 2021 às 14:04h
Atualizado em: segunda, 14 de junho de 2021 às 14:23h

Vencer é o desejo final de todo esportista. Mas as pequenas conquistas experimentadas ao longo desse caminho muitas vezes são o que transformam a apreço por um esporte em paixão. Assim é a vida de Alexandro Machado Dutra, 19 anos, e Marcelo Piton, 29 anos. Amantes do vôlei, eles encaram desafios diferentes em meio à pandemia, mas nutrem o mesmo sentimento pelo esporte que amam.

No primeiro episódio da série Olímpicos, o AU conta a história dos dois esportistas, cuja dedicação ao vôlei serve de inspiração e imersão no espírito das Olimpíadas, que será tema de outras reportagens nas próximas semanas.

Origens distintas para o mesmo sonho
De família humilde, desde pequeno Dutra se envolve com o esporte. O sonho do menino de 19 anos começou ainda quando ele tinha 10 anos, pois ser atleta é motivo de orgulho para os pais que trabalham na roça. Com voz rouca e tom de entusiasmo, o menino nascido em Alpestre teve seu primeiro contato com o esporte quando começou a jogar handebol, e pouco tempo depois, iniciou no vôlei. Aos 14 anos, já estava participando de campeonatos pelo time da cidade de Saudades (SC), onde reside há aproximadamente 13 anos. 

Da mesma forma, Piton também carrega a paixão pelas atividades físicas desde a infância. Hoje treinador de uma escolinha de vôlei em FW, ele narra que seu envolvimento no esporte começou fora da escola, brincando de jogar bola desde pequeno, com o pai e o irmão mais velho, mas se intensificou no colégio. “Não tínhamos muitas coisas para fazer, além de brincar. Comecei a ter maior comprometimento com o esporte a partir da escola. Por volta do sexto ano, começaram as disciplinas de educação física, e então comecei a jogar vôlei”. 

Publicidade


Propulsor do esporte
Ao falar de si e contar sua história, Dutra se apresenta como atleta. O orgulho em sua fala se manifesta ao contar sua trajetória no esporte. O percurso do esportista, que atualmente ocupa a posição de líbero, se estendeu por quatro anos, mas ele lembra que tudo começou na escola. 

– No ensino fundamental, aconteceu uma mudança. O novo professor de Educação Física era ex-técnico do time feminino de vôlei da cidade, e ali foi o ponto essencial da minha vida como atleta. Ele queria ensinar, treinar os alunos, e foi então que comecei a participar de alguns campeonatos – afirma o jovem.

Atuando como ponteiro, ele disputou três edições dos Jogos Escolares de Santa Catarina (Jesc), conquistado medalhas de bronze e prata.
Já Piton, que antes jogava futebol no loteamento perto de casa, hoje é bacharel e licenciado em Educação Física. Durante a faculdade, passou a se dedicar a modalidade desde cedo, quando começou a auxiliar em uma escolinha de vôlei particular na cidade.

– Eu gostava muito de esporte, sempre quis aprender. Na escola, quando o professor de educação física passava algum exercício ou prática, eu era um dos primeiros a fazer. Com o tempo comecei a gostar de jogar vôlei. Na faculdade, eu vi uma oportunidade e tive a iniciativa de somar no projeto e contribuir com o que eu sabia – relata o instrutor.

Embora estivesse contente com o rumo que a carreira ia levando, o treinador queria mais. “Pensei em por que não fazer um projeto de uma escolinha de vôlei para a comunidade, para aqueles que não têm recursos para investir no esporte, mas que sempre esperam uma oportunidade?”, relembra Piton. Foi então que ele se encontrou e soube o que gostaria de fazer.

A partir disso, ele começou a pesquisar projetos para ter uma base para dar início à escolinha. “Era preciso muito estudo e me profissionalizar para poder ensinar tudo aquilo que eu sabia. No início, eu recebia ajuda, mas fazem seis anos que estou com a escolinha sozinho”, relata.

As aulas – que chegaram a atrair 100 alunos em anos anteriores – ocorriam duas vezes na semana, em momentos com divisão entre mais novos e mais experientes. Hoje, ele acumula 10 anos de relacionamento com seus alunos e comanda uma turma de 20 crianças, que por hora estão paradas em função da suspensão das atividades pela pandemia.

Decepção e renascimento para Dutra
Por sua vez, Dutra seguia a passos largos para se tornar um atleta profissional de vôlei, mas durante o caminho, surgiu um empecilho. O ano de 2016 ficou marcado como seu último ano jogando pelo time masculino de Saudades (SC). Por ser uma cidade interiorana do Oeste do Estado, e com poucas oportunidades, o time foi se dissolvendo ao longo do tempo. Nos campeonatos disputados naquele ano, não tiveram os resultados esperados, ficaram em segundo lugar na fase regional. “Eu sabia que era meu último ano e que eu tinha que dar meu melhor em quadra e ajudar o time no máximo que eu conseguisse”, conta. 

Foram muitas incertezas e inseguranças que abalaram Dutra quando pensava no futuro. Sem desanimar e para não desviar da direção do esporte, voltou a praticar handebol. O sonho em se tornar um atleta profissional de vôlei foi guardado, mas nunca se perdeu no coração do jovem esportista. Durante o período de recesso, treinou handebol ao longo de dois anos, mas ainda assim não perdeu o contato com a modalidade do coração. Na esperança de voltar às quadras, reunia alguns amigos para ir treinar e manter o mesmo rendimento quando voltasse para os jogos e campeonatos de vôlei.

Do sonho antes guardado para as quadras, Alexandro voltou a praticar o esporte do coração. Ele recebeu uma proposta para jogar na temporada de 2019 no time de Iraceminha, cidade do Oeste catarinense e concorrer aos chamados Joguinhos Abertos de Santa Catarina, classificando-se em terceiro na seletiva regional e conquistando o posto de time destaque no Oeste do Estado. No mesmo ano, o jogador avançou alguns passos na trilha em se profissionalizar, e competiu em uma seletiva na cidade litorânea de Praia Grande (SP).

– Eu vi uma oportunidade. Conversei com o técnico do Vôlei Praia Grande/Santos FC para entender como seria a seletiva e tive uma perspectiva um pouco diferente, imaginei que teriam poucos atletas na posição de líbero, então peguei um ônibus e segui para São Paulo. Cheguei e percebi que tinham quase 20 atletas da mesma posição e fiquei meio assustado, mas eu fiz o que sempre faço, entrei e joguei com o coração. Nas classificações eu fiquei em primeiro e passei para a final com mais três. Infelizmente, na final eu fiquei um pouco nervoso, fiquei em quarto e fui cortado. Mesmo assim eu fiquei feliz, foi a primeira seletiva que eu participei e foi muito gratificante chegar tão perto sendo um dos poucos atletas de Santa Catarina – conta o alpestrense.

As maiores dificuldades
Das pedras no caminho, a altura é uma delas ao praticar a modalidade do vôlei. Com a voz arrastada e alguns suspiros, o atleta relata que a maior dificuldade é seu tamanho. Relata, com pesar, que a maioria dos times querem jogadores de alta estatura, e os jogadores de estatura mais baixa acabam ficando de lado, mesmo que sejam habilidosos. “Para mim, que sou mais baixinho, isso é bem difícil. Uma condição física, além da minha possibilidade de mudar, por ser mais baixo, acaba sendo um desafio e uma das maiores dificuldades para as oportunidades”, argumenta Dutra.

Mas, com a pandemia, a altura passou a ser um problema pequeno. No início do ano passado, o esportista havia fechado para atuar na temporada de 2020 com o grupo do Bento Vôlei, em Bento Gonçalves, mas o treino durou apenas um mês. “Eu precisei voltar para casa e a temporada de 2020 foi encerrada em função da pandemia. Depois disso, eu não joguei mais”.

Para Piton, a pandemia também trouxe danos severos ao ofício, especialmente pelo esporte ter poucos incentivos nas regiões interioranas dos Estados. Ainda assim, ele mantém a esperança e relata que também considera uma conquista oportunizar às crianças praticarem um esporte diferente e proporcionar outras experiências, mesmo com poucos recursos.

–  A maior dificuldade é o recurso, eu precisei ir atrás de tudo. Para conseguir uma camiseta para cada aluno, eu precisei bater de porta em porta, pedir ajuda. O financiamento é por meio de patrocínio, o local que são realizadas as aulas é locado, não temos muito auxílio e quase nada de recursos ou investimento, então precisamos de patrocínios. Se não fossem os patrocinadores, não sei como poderia continuar com a escolinha de vôlei – relata o professor.

Sonhos e metas
Quase todo atleta sonha em participar de uma Olimpíada e representar o país. Mas Dutra ainda não tem essa aspiração. Para ele, no momento, o maior sonho é poder ajudar e, acima de tudo, poder orgulhar a família, como atleta e como pessoa. “Depois que eu alcançar isso, eu passo a pensar nesse sonho, que é em integrar a Seleção Brasileira e quem sabe disputar uma Olimpíada. Mas, no momento, é preciso treinar, se dedicar, competir e tentar evoluir”, finaliza.

No momento, Piton tem preocupações em relação à manutenção da escolinha no futuro e diz ter apenas uma certeza. “Vou continuar, tentar algum patrocínio e mesmo que eu não consiga, a escolinha vai prosseguir. No começo eu não sabia muito o que eu queria, mas hoje eu sei que o que eu realmente gosto de fazer é ensinar. A sensação de estrar em quadra e entre amigos é muito boa, mas a minha sensação preferida é poder ensinar. Na minha visão, para se profissionalizar no vôlei tem que ter muita disciplina. É um dos esportes mais difíceis de aprender e ensinar. Tem que ter muito foco e saber o que você quer e quem você quer ver. Para o vôlei, quanto mais tempo você passa dentro de uma quadra, melhor, e poder ver aquilo que eu ensino para alguém se tornando outros sonhos não tem preço”, encerra.

Diante desse momento, sonhar se torna cada vez mais difícil. Com a pandemia, Dutra e Piton precisaram encerrar as atividades sem previsão de retorno. Tanto o professor quanto o atleta estão sem as quadras desde o começo da pandemia e ambos definem a sensação em apenas uma palavra: tristeza. Mas, mesmo sem perspectiva de volta, seguem otimistas em continuar o que amam fazer e esperam ansiosamente a oportunidade de mais uma jogada feita no ar.

 

*Sob supervisão de João Victor Gobbi Cassol
 

Fonte: O Alto Uruguai